quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

MALTRATAR NÃO RIMA COM GOSTAR

Em dia de S. Valentim consideremos as relações de namoro mas no seu lado B, sim, existe o lado B desta relação que deveria ser bonita.
Em nova edição do estudo da UMAR, União de Mulheres Alternativa e Resposta, relativo a 2017 envolvendo 4652 jovens com uma média de 15 anos de idade em que cerca 3000 responderam já ter estabelecido relações de namoro os dados são preocupantes.
Dos que já estabeleceram relações de namoro 56% relatam comportamentos que configuram algum tipo de violência.
Cerca de 40% entende que impedir o parceiro de usar algum tipo de roupa não é violência, como também 25% entende que a troca de insultos numa discussão será “normal”,
Cerca de 4000 entendem que forçar o beijo ou relações sexuais é “legítimo” como 25% acha que se não deixar marcas ou ferida não existe agressão física.
Verdadeiramente preocupante como é saber que os dados dos estudos da UMAR têm vindo a evidenciar o aumento da incidência e do entendimento de normalidade.
Também outro trabalho agora conhecido realizado no âmbito do Programa UNi+ — Prevenção da Violência no Namoro em Contexto Universitário, desenvolvido pela Associação Plano i e desenvolvido em contexto universitário com cerca de 1800 jovens com média de 23 anos é inquietante. Mais de metade dos inquiridos, 56,5% foi vítima de violência no namoro e 37% admitem ter assumido comportamentos dessa natureza. Estamos a falar de estudantes universitários.
Esta realidade tem vindo a assumir proporções inquietantes e, do meu ponto de vista, não tem merecido a atenção que a sua gravidade e prevalência justificam. Provavelmente começa por aqui a tragédia da violência doméstica que parece indomesticável.
Os dados que se conhecem convergem no indiciar do que está por fazer em matéria de valores e comportamentos sociais. Acresce que boa parte das situações de abuso não são objecto de queixa.
Este conjunto de dados é preocupante, gostar não é compatível com maltratar, mas creio que não é surpreendente. Os dados sobre violência doméstica em adultos que permanece indomesticável deixam perceber a existência de um trajecto pessoal anterior que suporta os dados destes e de outros trabalhos. Aliás, nos últimos anos a maioria das queixas de violência doméstica registadas pela APAV foram de mulheres jovens.
Os sistemas de valores pessoais alteram-se a um ritmo bem mais lento do que desejamos e estão, também e obviamente, ligados aos valores sociais presentes em cada época. De facto, e reportando-nos apenas aos dados mais gerais, é relevante a percentagem de jovens, incluindo estudantes universitários, que afirmam um entendimento de normalidade face a diferentes comportamentos que evidentemente significam relações de abuso e maus-tratos.
Como todos os comportamentos fortemente ligados à camada mais funda do nosso sistema de valores, crenças e convicções, os nossos padrões sobre o que devem ser as relações interpessoais, mesmo as de natureza mais íntima, são de mudança demorada. Esta circunstância, torna ainda mais necessária a existência de dispositivos ao nível da formação e educação de crianças e jovens; de uma abordagem séria persistente nos meios de comunicação social; de um enquadramento jurídico dos comportamentos e limites numa perspectiva preventiva e punitiva e, finalmente, de dispositivos eficazes de protecção e apoio a eventuais vítimas.
Só uma aposta muito forte na educação, escolar e familiar, pode promover mudanças sustentadas nesta matéria. É uma aposta que urge e tão importante como os conhecimentos curriculares. 
Entretanto e enquanto não mudo, "só faço isto, porque gosto de ti, acreditas não acreditas?"

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